Caso Alibert - Documentação Oficial e Outras de Origens Diversas.

Queridos leitores...

              Acredito que o conteúdo dessa página não vá ser interessante para a maioria dos que visitam nosso blog. Entretanto, tenho absoluta convicção que será material de ouro para aqueles que estudam e se interessam a fundo pela questão da imigração em geral. Da FRANÇA para o BRASIL em particular. Todos os documentos que serão apresentados aqui, todos já devidamente traduzidos do original francês (peço desde já desculpas pelas possíveis falhas, decorrentes do fato de que ainda não sou proficiente na língua) me foram encaminhados por duas fontes básicas: PASCALE LAGAUTERIE e ISABEL (AUDEBERT) PINTO. Aqui apresentarei um por um,  para sua apreciação e reflexão. Quem sabe consigamos um dia entender os meandros de uma questão tão complexa. Até mesmo nos dias de hoje. São documentos todos do final do século XIX, de origens diversas. Mas todos versando sobre o personagem FIRMIN FRANÇOIS ALIBERT e sua empreitada que resultou na vinda para o BRASIL de nossos bisavós e tantas outras famílias de perigordinos. Considerem-me sempre disponível para o esclarecimento de qualquer dúvida. E todos os possíveis comentários serão sempre bem vindos. Boa leitura! Abraços!

                                               



1- Este primeiro documento, do qual vocês pode apreciar abaixo o original  na página DOCUMENTOS ANTIGOS, nº 7  , refere-se ao contrato de trabalho que teria sido  apresentado aos imigrantes e que foi assinado somente por FIRMIN FRANÇOIS ALIBERT, como contratador e HENRI AUDEBERT, como representante dos contratados (?) . Vejamos: 


Gabinete do Governador da Dordonha - Arquivo do Departamento da Dordonha - Propriedade Pública.
                                            
                                                                                                           Périgueux, .../.../...

                                                       Entre os abaixo-assinados

          Firmin François Alibert, oficial da Ordem Imperial da Rosa, proprietário residente no Brasil, província de Minas Gerais, Fazenda de Monte Cristo.
          Agindo tanto em seu nome pessoal quanto em nome, e como se portanto fosse, o Comendador Joaquim José Gonçalves de Moraes, capitalista e proprietário residente no Brasil, na acima citada província, do qual ele é também administrador.
          E Henri Audebert, agricultor, residente em Farérié, comuna de Tourtoirac, agindo em nome e como mandatário de Guillaume Audebert, seu irmão, casado com Marie Favard, pai de duas crianças, agricultor residente em Les Charreaux, comuna de Hautefort, Dordonha, segundo sua procuração passada diante do Sr.Merlet, notário em Hautefort, hoje, do qual o brevet*¹ original se origina. 
          São asseguradas as seguintes convenções:
Artigo Primeiro - Com o objetivo abaixo explicado, o senhor Guillaume Audebert se compromete a seguir com sua mulher e seus filhos com o senhor Alibert à sua residência e a permanecer sob sua direção todo o tempo abaixo convencionado;
Artigo Segundo - Por seu lado, o senhor Alibert se compromete a transportar até seu destino a esposa Audebert e sua progenitura.
Artigo Terceiro - Os imigrantes terão o direito de levar com eles sua roupa de cama e outros utensílios domésticos e eles não terão nada a pagar pela entrada dos ditos objetos no Brasil, isto é, por "despesas" de alfândega.
Artigo Quarto - Eles serão alimentados gratuitamente durante um ano à partir do dia de sua chegada ao Brasil.
          Esta alimentação comporá exclusivamente de toucinho, arroz, feijão preto, milho e café com açúcar mascavo. 
Artigo Quinto - Chegando, o contratado será alojado em condições salubres pelo contratante e receberá, por outro lado, para trabalhar, um lote de cafezal em plena produção.
           Ajudado pela família, ele deverá ter essa plantação em bom estado, quer dizer, ele deverá fazer muitas capinas por ano, replantar cuidadosamente os pés de café perdidos e fazer a colheita.
Artigo Sexto - Todos os cereais, todos os produtos que não o café que o pretendente puder cultivar em seu lote, assim como os animais que ele possa criar, lhes pertencerão na totalidade.
Artigo Sétimo - Em compensação por todas as vantagens acima mencionadas, o produto da colheita do café proveniente do lote confiado ao senhor Audebert será repartido pela metade entre ele e o comandatário;
Artigo Oitavo - O acima citado colono deverá igualmente, dentro do período de dois anos, à contar do dia de sua chegada, reembolsar o senhor Alibert osd adiantamentos que este lhes fizeram para sua viagem e durante a mesma.
Artigo Nono - A duração do presente contrato será de quatro anos inteiros e ...(?).
Artigo Décimo - Enfim, em caso de não execução de alguma das cláusulas precedentes, o senhor Audebert se obriga à pagar ao senhor Alibert uma indenização de trezentos francos.

                    Feita cópia em Hautefort, 22 de Julho de 1885.


Aprovando a escrita acima                                               Aprovando a escritura acima

          Audebert                                                                      Firmin François Alibert

          

           Vistas para legalização assinaturas do senhor Audebert apostas acima.
                                    Hautefort, 26 de Agosto de 1885
                                              Senhor prefeito
                                                  Magueur

Cópia conforme o ...(?) Geral

(asinado) ... (?)

*¹  - Segundo o "Nouveau Petit Larousse Illustré", de Claude et Paul Augé ( Librairie Larousse - 1948), Act en brevet significa: ato notariado do qual o original, não sendo guardado nas minutas do notário, é remetido às partes e não contem a fórmula executória.




2- Vamos ao segundo documento, que fala sobre a proibição da emigração para o BRASIL.

                                                               



                                                                                              Paris, Agosto 1875
                                           
                                                      Manuscrito: este documento te mostra a proibição da emigração para o Brasil.


                                                                      Senhor, eu vos enviei, em 14 de Abril último uma cir cular tendo por objeto a proibição às agênicas de emigração de engajar emigrantes com destino à Venezuela. Duas informações transmitidas pelos representantes do governo francês no Brasil
 fazem saber que, nesse país, a situação em que se encontram os emigrantes era igualmente deplorável e resultava para nossos e resultava para nossos cônsules, tanto no Brasil quanto na 
Venezuela, a necessidade de repatriar às custas do governo um grande número de nossos compa-
triotas.
                                   Para colocar um fim aos abusos que se produziram nesses últimos tempos, e que parecem dever se agravar ainda mais, eu decidi, de acordo com  os Excelentíssimo Senhor Ministro dos Negócios Estrangeiros e do Interior que, até nova ordem, o recrutamento de nossos compatriotas para o Brasil será proibido a todas as agências de emigração.
                                  Eu creio dever vos lembrar novamente senhor, que as agências de emigração que não tomarem ciência dessa injunção, se expõem à retirada da autorização que lhes foi concedida, sem prejuízo das medidas que podem atingí-los, segundo a gravidade dos fatos que lhe sejam reprovados.
                                                Receba, Senhor, a "afourance" (?) de uma perfeita consideração.                                                                                                                                                              
                                                                        Ministro da Agricultura e do Comércio
                                                                                                   ........................
                                                                                                      assinatura
                                               


3- Tratativas de resolução do impasse ainda, na cidade de Bordeaux.

                                                     


Comissariado Especial de Police das Estradas de Ferro 
Caso Alibert - Contravenção ao Artigo I da lei de 18 de Julho de 1860 sobre a emigração e circular do Senhor Ministro da Agricultura e do Comércio, de 03 de Agosto de 1875 interditando a emigração francesa para o Brasil. 

                                                                                Bordeaux, 05 de Setembro de 1885.
                     
                                                             RELATÓRIO

Seguindo novas instruções, recebidas do Senhor Procurador da República de Périgueux, nós procuramos, essa manhã o senhor Alibert, no hotel onde ele estava hospedado e o entregamos nas mãos do senhor Procurador da República em Bordeaux ....(?) foi lançada contra ele pelo Ministério Público de Périgueux.
O senhor Procurador da República de Bordeaux, esperando o mandato ...(?) que deve lhe ser enviado, nos deu a ordem de conduzir imediatamente o inculpado diante de seu colega da Dordonha. O que foi feito. Além disso, seguindo as ordens do Ministério Público, eu interroguei muitas famílias engajadas pelo senhor Alibert sobre as promessas que lhes tinham sido feitas. Essas declarações figuram no dossiê enviado ao Ministério Público.
E mais, conforme as instruções do despacho ministerial recebido na noite de ontem, autorizando o embarque no "Orenoque" das famílias engajadas na Dordonha e na Haute-Savoie, pelo senhor Alibert. Nós prevenimos os emigrantes, antes do embarque da situação da ...(?) na qual eles se encontravam. Nos lhes fizemos compreender quais  eram  seus riscos e perigos
Nós regularizamos a situação, do ponto de vista da emigração, para imigração autorizada, de Bordeaux, escolhida pela Companhia
As 25 famílias, compreendendo 90 pessoas, embarcaram essa manhã, às 11hs, em Bordeaux; tendo todas vendido suas casas, para ir para o Brasil, elas preferiram fazer a viagem.

                                                                                     O Comissário Especial
                                                                                      
                                                                                      ..................................
                                                                                              Assinatura


4- Continuando nas tratativas.


                                                          


Ministério do Interior
Direção da Polícia Geral
3º Bureau
Emigração (manuscrito)
Recebido em 03 de Setembro ao meio-dia (manuscrito)
Departamento da Dordonha - Propriedade Pública ( carimbo atual)
Secretário Geral
Urgente
Ao Senhor |Procurador cópia em 03 de Setembro
Departamento da Dordonha ... Divisão - Chegada 3 de Setembro de 85. (carimbo)


                                                                              
                                                                               Paris, 2 de Setembro de 1885
               Senhor Governador, por sua carta de 29 de Agosto, o senhor me denunciou casos de contratações com destino ao Brasil, de famílias de emigrantes colonos recrutados nas comunas rurais de seu departamento.
               Sem entrar no exame dos contratos, dos quais os artigos 7, 8 e 10 me parecem colocar os colonos à vontade do proprietário para "a conta" (?) do qual eles são engajados, eu tenho a honra de vous informar que pela circular em anexo e Ministro da Agricultura e do Comércio  proibiu de uma maneira absoluta os recrutamentos de emigrantes com destino ao Brasil. Os motivos que o fizeram tomar essa decisão não parecendo ter desaparecido inteiramente, a humanidade considera como um dever da Administração desaconselhar até nova opinião aos emigrantes franceses de se dirigir para essa parte da América. 
               Queira por gentileza encaminhar essas instruções aos prefeitos das comunas interessadas, recomendando-lhes fazer um uso discreto, em proveitos dos emigrantes engajados em sua circunscrição.
               No que concerne ao senhor Alibert, por intermédio do qual foram efetuados os recrutamentos assinalados, segundo os termos do Artigo 1º da lei de 18 de Julho de 1860, ninguém pode se consagrar às operações de recrutamento ou de transporte de emigrantes sem estar autorizado pelo Ministro do Comércio, mediante depósito de uma caução; que autorizações provisórias para operações isoladas são expedidas, quando cabível, sob solicitação, às pessoas que não se dedicam habitualmente a essas operações.; - que o senhor Alibert não está munido da autorização regulamentar e, consequentemente, que ele incorreu a aplicação do artigo  10 da lei de 18 de Julho de 1860, punindo com uma multa de 50 a 5.000 francos as infrações às disposições do artigo 1º da mesma lei; - por esses motivos, eu vos peço deferir imediatamente o abaixo nomeado ao Ministério Público.
               A circular da Guarda dos Oceanos, em data de 12 de Janeiro de 1874 (nº 7.516, B.3) expôs os motivos que devem buscar rigorosamente a aplicação da lei sobre a emigração.
               Eu vos peço o favor de me fazer conhecer, em tempo útil, o seguimento dado a este caso.
               Receba, Senhor Governador, a certeza de minha consideração mais distinguida.
                                                     
                                                       Pelo Ministro do Interior e Diretor da Polícia Geral,

                                                                                                        ...........................................
                                                                                                                   (assinatura)
           
               

5- Impasse já em Bordeaux, onde os emigrantes ficaram hospedados esperando que a justiça decidisse  sobre as questões legais envolvidas no caso Alibert.


                                                   


Rede Orleans e Sul
Comissariado Especial de Polícia das Estradas de Ferro
Nº 2101 (?)
Assunto:
Contravenção ao Artigo 1º da lei de 18 de Julho de 1860 sobre a emigração e circular do senhor Ministro da Agricultura e do Comércio de 03 de Agosto de 1875 proibindo a emigração francesa para o Brasil.
Departamento da Dordonha - Propriedade Pública (carimbo)


                                                                                             Bordeaux, 5 (?) de Setembro de 1885.

                                                                       RELATÓRIO


                Continuando (?) as investigações nos hotéis e aubergues oferecidos aos imigrantes em Bordeaux eu descobri na data de 2 de Setembro, que um senhor Alibert, François Firmin, proprietário residente no Brasil (Minas Gerais) tratando como procurador do senhor Joaquim José Gonçalves de Moraes, proprietário no Brasil havia engajado na Dordonha e na Haute Savoie um certo número de famílias francesas como colonos e devia embarcá-los à bordo do Orenoque deixando o porto de Bordeaux dia 5 do corrente. Eu me dediquei imediatamente a uma sindicância dondo resultou o que se segue: o senhor Alibert, de 50 anos, nascido em Terrasson, Dordonha, domiciliado no Brasil, deixou o Rio em 5 de Abril último, no vapor "Gironde" e chegou a Bordeaux a (...) do mesmo mês. Ele se dirige em seguida para Paris e depois de ter estado no Consulado do Brasil ele entrou em acordo com a Administração Central da "Messageries Maritimes" , em Paris, para o embarque de 70 à 80 agricultores, à razão de 180 francos por (...) até o Rio.
Por carta datada de 9 de Junho de 1885, acrescentada ao ... (?) agência gerak de Bordeaux aceita os ...(?)  feitas pelo senhor Alibert para o embarque ...(?) ditos passageiros; este indivídio, após ter recrutados seus  ... (?) depositou ...(?) "Campagnie des Messageries Maritimes" ...(?) Bordeaux, uma soma de 11.000 francos. Nesse caso, o senhor Alibert infringiu o artigo 1º, artigo 10 ...(?) da lei de 18 de Julho de 1860 sobre a imigração para ....(?)  ter sem a autorização do Ministério da Agricultura e do Comércio, empreendido operações de engajamento e de transporte de emigrantes.
Esse indivíduo, tratando em seu nome e no do senhor de Moraes, foi ajudado por um senhor Villotte, antigo tabelião em Hautefort (Dordonha) que sózinho recrutou 11 famílias.
O senhor Alibert tinha ...(?) além disso, um contrato com cada família de emigrantes, cópia do qual está anexada. Há então que acrescentar à acusação do senhor Alibert uma contravenção ao artigo 1º da lei de emigração; processo verbal foi dirigido contra ele, transmitido ao Ministério Público de Bordeaux, governador da Dordonha e Ministério Público de Périgueux, submetendo-lhe o caso.           Eu acredito dever, por outro lado, chamar vossa atenção sobre a maneira de agir, nessa circunstância, da Compagnie des Messageries Maritimes.  Essa Companhia, segundo a instrução ministerial, está isenta do controle da emigração; nessa circunstância, ela não deveria ter aceitado de um simples particular o engajamento de emigrantes, o senhor Alibert não sendo agente de emigração  e contudo trataram do ponto de vista ...(?) sobre o mesmo ...(?) que as divergências autorizadas em Bordeaux. Seria desejável que a Compagnie Messageries Maritimes, companhia subvencionada pelo Estado e isenta do controle de imigração se conforme, no futuro, com prescrições ministerial e não aja simplesmente em seu interesse.
           A Compagnie des Messageries Maritimes ...(?) esta manhã, submetida ao tribunal (?) pelo caso, aconselhou o senhor Alibert a regularizar a situação dos emigrantes fazendo assentar os 80 contratos por um agente autorizado de emigração em Bordeaux. O que é feito atualmente: cada contrato, em ...(?) da contravenção imputada ao senhor Alibert, comporta um timbre de 0,60 centavos, a Compagnie des Messageries Maritimes tratando diretamente com um simples particular, trazia um real prejuízo ao Estado.
          Em anexo, a lista dos passageiros engajados pelo senhor Alibert.
          Segundo as instruções ...(?) pelo senhor Procurador da República de Périgueux, nós procuramos, essa manhã o senhor Alibert e nós o remetemos às mãos do Procurador da República de Bordeaux, mandato de prisão (?) foi expedido contra ele. Além disso, conforme  instruções do despacho ministerial recebido ontem autorizando o embarque no Orenoque das famílias recrutadas na Dordonha pelo senhor Alibert nós prevenimos esses imigrantes da situação da região para a qual eles iriam e que era responsabilidade deles os riscos e perigos, tendo feito regularizar a aituação do ponto de vista da imigração por um agente autorizado de Bordeaux.

                                                                                             
                                                                                  O Comissário Especial
                                                                                  ......................................
                                                                                           assinatura
                                                                                             carimbo
          


6- Esse documento toca na questão do envolvimento da irmã de ALIBERT na questão dos imigrantes perigordinos vindos para o BRASIL.


    

Rede de Orleans e do Sul 
Comissariado Especial de Polícia das Estradas de Ferro 
Nº 2110
Assunto:
Caso Alibert
Departamento da Dordonha - Propriedade Pública (carimbo)

                                                                                            
                                                                    Bordeaux, 6 de Setembro de 1885.

                                                           RELATÓRIO

               Conforme as instruções do senhor Procurador da República de Périgueux, em data de 4 do corrente nós escutamos, antes do embarque no Orenoque, muitos emigrantes que nos declararam ter sido contratados para o Brasil e por conta do senhor Alibert, por sua irmã que habita em Terrasson e pelo senhor Villotte, antigo tabelião que habita em Hautefort.
               Nessa circusntância, a irmã de Alibert e o senhor Villotte teriam infringido o Artigo 1º da lei de emigração, ocupando-se da contratação de emigrantes sem autorização. Foram colhidas declarações de muitos emigrantes e transmitidas ao Ministério Público de Périgueux.
               A senhora Alibert foi ... (?) diante do Procurador da República de Périgueux, que a deixou em liberdade, dando-lhe ordem de se apresentar quarta-feira diante da justiça.
                                                                                             O Comissário Especial,
                                                                                             .....................................
                                                                                                       assinatura                                                                                     
  

7- O documento abaixo trata-se da transcrição do julgamento de ALIBERT, ocorrido no dia 23 de Setembro de 1885.  (Recebi esse documento já transcrito do original, mas ainda em francês. O que faço aqui é apenas traduzir para vocês a dita transcrição).

Número do arquivo no tribunal: 251
Número do tribunal: 679
Número do gabinete de instrução
Natureza do delito: engajamento e transporte de emigrantes com destino ao Brasil sem autorização.
Testemunhas:
Data do delito: 1885
Prisão preventiva:
Data do julgamento contraditório: 23 de Setembro de 1885.
Dispositivo do julgamento: quitados (ou absolvidos. Não conheço suficientemente de jurisprudência para escolher a palavra que mais se adequa ao texto. Nesse caso, isso seria de suma importância pois altera completamente o sentido do parágrafo. Aconselho ler com reservas).
Condenações anteriores
   

                               Entre o Senhor Procurador da República junto (?) ao tribunal civil e correcional "séant" (?)  em Périgueux propugnando a repressão do delito a seguir especificado, de uma parte; e 
1) Alibert François, idade de ... anos, proprietário residente no Brasil, província de Minas,
2) Villotte Noel, idade de ... anos, antigo tabelião residente em Hautefort, 
inculpados de engajamento e transporte de emigrantes com destino ao Brasil sem autorização.
Que comparecem diante da justiça.

A causa designada, ele leu as peças do processo constatando o delito, os indiciados foram em seguida interrogados e o ministério público requeriu a aplicação da lei.

O senhor Schaeffer apresentou a defesa dos dois inculpados.

Sobre o que, após deliberadas:

Visto que o senhor François Alibert residente no Brasil, província de Minas é acusado de ter se dedicado no corrente ano de 1885, no distrito de Périgueux, à operações de engajamento e de transporte de emigrantes destinados ao Brasil sem ter sido autorizado pelo Ministro do Comércio;

Que o senhor Noel Villotte, antigo tabelião em Hautefort é acusado de ter se dedicado, na mesma época e no mesmo lugar à operações de engajamento de emigrantes por conta do senhor Alibert, fatos previstos e punidos pelos artigos 1 e 10 da lei de 18 de Julho de 1860;

Visto que os dois acusados não negam os fatos materiais que lhes são imputados mas alegam em sua defesa que eles ignoravam que a autorização do Ministro do Comércio fosse necessária e que, por outro lado, o artido 1º da lei de 18 de Julho de 1860 não lhes é aplicável, visto que, na verdade, esse artigo fala em seu texto que "ninguém pode 'empreender' operações de engajamento ou de tranporte de emigrantes...", que a palavra 'empreender' traz nela a ideia de um ofício, de um comércio, de uma indústria;

Que neste caso, não se pode dizer que os senhores Alibert e Villotte exerceramo comércio ou a indústria do recrutamento e do transporte de emigrantes;

Que de fato estabeleceu-se no processo que o senhor Alibert, proprietário no Brasil, faltando-lhe braços para cultivar suas propriedades ou aquelas do senhor Marquês de Moraes, do qual ele parece o mandatário, procurou suprir aos braços que lhe faltavam e tratou com muitas famílias do Périgord que consentiram em transferir-se para o Brasil para trabalhar as ditas propriedades mediante vantagens consideráveis constatadas por contratos parecendo regulares e válidos para uma duração de 4 anos; que o senhor Alibert foi ajudado por Noel Villotte para o engajamento desses emigrantes;

Que esses contratos passados com os emigrantes podem ser considerados contratos de aluguel de trabalho ou antes como contratos de "colonage à moitié fruits" (exploração por um colono; espécie de arrendamento no qual o arrendatário é remunerado pela divisão dos produtos produzidos pela terra. Não confundir com "colonat", em que o colono e sua família ficavam perpétuamente ligados à terra cultivada); que as convenções que ele contém são perfeitamente lícitas entre particulares capazes de prestar um serviço, que é verdade que para sua execução é preciso necessáriamente chegar ao transporte ao estrangeiro e à emigração;

Que na Franças o governo não é favorável, é verdade, à emigração no interesse da agricultura, mas que ele por outro lado não o proibe, em respeito a liberdade individual;

Que do texto mesmo da lei, não se saberia induzir que ela pretendeu defender as convenções "pré-rappellées" (?), mas que ela visou somente aqueles que se ocupam habitualmente de transportar emigrantes no interesse de terceiros;

Visto que, do exame dos motivos e da discussão da lei de 1860, resulta que esta lei ocupou-se somente das agências de emigração autorizadas pelo governo e de seus agentes ou das pessoas que usurpam a função desses agentes se dedicando a busca e ao transporte de emigrantes, mas que a lei não quis visar o simples particular que, em seu interesse próprio, trata com cidadãos franceses para ir trabalhar propriedades situadas em país estrangeiro;

Que o projeto da lei de 1860 dizia que "ninguém pode empreender o recrutamento ou o transporte de emigrantes", a expressão de recrutamento, diz o relator, parece ofensiva para a indústria que se dedica à expedição de emigrantes, vendo-se por ali que, no espírito da lei, não é jamais questão de comércio e indústria;

Que se consultamos o decreto de 9 de Março de 1861 que determina as condições nas quais pode ser concedida a autorização de empreender as operações de engajamento e de transporte de emigrantes, vê-se igualmente que o decreto ocupa-se apenas de companhias ou agências de emigração e de seus agentes;

Que em seguida ao decreto de 1861, o Ministro do Interior, querendo prevenir as manobras dos interesseiros que vivem às expensas dos emigrantes levou a uma portaria que interdita a quem quer que seja toda solicitação a respeito dos emigrantes durante o trânsito através da França e |a estadia no porto de embarque;

Visto que dos documentos legislativos abaixo pode-se concluir que o legislador não teve outro objetivo, por considerações superiores de ordem e de humanidade, que regulamentar o recrutamento dos emigrantes e seu transporte ao estrangeiro;

Que ele ocupou-se apenas das agências de emigração e de seus agentes e daqueles que, com objetivo de lucro, tentassem substituir fraudulentamente as companhias autorizadas pelo governo mas que ele não teve como objetivo, de maneira nenhuma, visar os simples particulares tratando em seu interesse pessoal para a execução de contratos perfeitamente lícitos;

Por esses motivos, o tribunal diz que o senhor François Alibert, engajando um certo número de famílias do distrito de Périgueux para trabalhar propriedades situadas no Brasil, nem também Noel Villotte, facilitando à Alibert o engajamento dos trabalhadores dos quais ele tinha necessidade, não infringiram a lei de 18 de Março de 1860;

En consequência, ele os libera do processo dirigido contra eles, que é declarado mal fundado e isso sem custas;

Feito e pronunciado públicamente no Palácio da Justiça de Périgueux, em audiência do Tribunal Correcional em 23 de Setembro de 1885. Presentes Meritíssimo Mimaud, juiz exercendo funções de presidente, senhor Marchet, advogado chamado para completar o tribunal, juízes suplentes e advogados e advogados mais antigos semdp legitimamente impedidos,

Lassort, procurado

r da República, e Charles, escrivão.
                                                                                                                                                                                       
 8- Hoje trazemos o documento relativo a uma audiência pública ocorrida no TRIBUNAL DE APLEAÇÃO DE BORDEAUX. Esse é de todos o documento mais difícil de traduzir/transcrever, devido à letra quase ilegível. Mas faremos o melhor possível.

                                                                                                                                       

                                                                                                           

11 de fevereiro de 1886      

                   Audiência pública de quinta-feira, onze de fevereiro de mil oitocentos e oitenta e seis. Estando presentes: Meritíssimo Senhor  Dulamon, Cavaleiro da legião de honra. Presidente: Raveaud, Bernardy de Sigoyer, Bergier, Habasque filho e Ruvergey, Conselheiro; senhor Thézard, substituto do senhor Rouvieur General, E. Lagardère. (Seguem-se algumas assinaturas).

                   O Tribunal de Apelação de Bordeaux, Câmara Correcional, fez os julgamentos seguintes: entre o senhor Rouvieur, general apelante de um julgamento efetuado pelo Tribunal Correcional de Périgueux, de uma parte;
                   E 1º o chamado Alibert François, proprietário, residente no Brasil; 2º o chamado Noel Villotte, antigo notário, residente em Hautefort, os dois libertados pelo julgamento do qual vai ser aqui falado; o senhor Alibert, não presente, "comparecendo pelo senhor Claverie, solicitado"; o senhor Villotte, presenteà audiência, os dois citados.
                   De outra parte,
                   Fatos: os dois acima citados, acusados de engajamento e de transporte de emigrantes sem autorização, foram  ... (?) diante do Tribunal Correcional de Périgueux que, por julgamento datado de 23 de Setembro de 1885, os liberta ... (?) perseguição dirigida contra eles. Sem ... (?).
                   Sob ... (?) trazida pela lei, o senhor Rouvieur Général interpelou oficialmente essa decisão e a causa foi chamada à audiência pública de 4 de Fevereiro de 1886, ... (?) , a essa audiência, senhor Conselheiro Ruvergeyapresentou o relatório do caso; o senhor Presidente interrogou o acusado Villotte presente à audiência; o senhor substituto Thézard requereu a correção; senhor Scheaffer, advogado inscrito em  Périgueux, apresentou a defesa dos dois acusados, a causa, ... (?) deliberada: para a prisão foi pronunciada na audiência ... (?) a ausência dos acusados ou de seu curador, ... (?) acusados pela dita audiência e esse dia , quinta-feira onze de Fevereiro de 1886, na presença do senhor Claverie, solicitador ... (?) e depois de ter deliberado, o Tribunal, ... (?) magistrados que na audiência precedente, a prisão ... (?) foi feita em audiência pública.
                   Visto que a lei de 18 de Julho de 1860 "leva" à necessária autorização administrativa, que as empresas relacionadas ao recrutamento e ao transporte de emigrantes; que resultando mesmo da lei, da discussão à qual ela deu lugar, das prescrições regulamentares acrescentadas para assegurar execução, que o legislador, preocupado com a necessidade de proteger os emigrantes contra a violenta cobiça dos homens, não lhes assegurando mesmo as condições materiais e de higiene no curso da viagem, quis submeter à criteriosas garantias as empresas industriais organizadas com o objetivo de especulação, para facilitar a emigração para os países distantes ; que este pensamento é sobretudo revelado pelos termos do projeto de lei segundo o qual ninguém poderia empreender o recrutamento ou o transporte de emigrantes sem a autorização ... (?) o relatório apresentado ao corpo legislativo a palavra "recrutamento" foi suprimida porque poderia parecer ofensiva para a classe de industriais ... (?) regulamentar empresas relacionadas ao transporte, que elas deviam ... (?) e facilitar;
                  Visto que o governo jamais proibiu a emigração em respeito à liberdade individual; que ele então pode sonhar em proibir as convenções, intervenções na ordem dos contratos civis, para permitir ao trabalhadores tratados com os proprietários de domínios situados em países estrangeiros e de se engajar para trabalhar as terras como ... (?) em condições determinadas, mediante a divisão da produção.
                  Visto que ... (?) que Alibert é proprietário no Brasil onde ele obteve concessões de superfície considerável, e que ele era, ao mesmo tempo, administrador dos domínios do Comendador Moraes; que nessa qualidade ele tratou com muitas famílias do Périgord que foram engajadas para ir ao Brasil para cultivar as propriedades pertencentes ao acusado e daquela que ao acusado é confiada; que os contratos produzidos diante da ... (?) asseguram aos colonos vantagens incontstáveis e pautados com cuidado, como teriam podido fazê-lo contratos destinados a serem executados na França, as cláusulas relativas aos adiantamentos que devem receber os colonos, à sua instalação material e à divisão das colheitas; Visto que resulta ainda, dos documentos produzidos, que todas as condições estipuladas foram exatamente cumpridas e que os trabalhadores vindos do Périgord exprimem seu reconhecimento pelos cuidados com os quais eles foram cercados e pelas vantagens que lhe advieram  da execução leal dos contratos; que as assinaturas das quais esses atestados são revestidos foram legalizadas pelo Consulado da França no Brasil, o que imprime um caráter de incontestável sinceridade aos testemunhos invocados poe Alibert;
                 Visto que não se saberia então assimilar está último a uma empresa de transportes que se limita a conduzir emigrantes para a terra estrangeira, deixando-lhes em seguida a tarefa de procurar estabelecer-se ou trabalho, no meio das dificuldades que lhes cercam; que Alibert, ao contrário, só tratou, fora de todo pensamento comercial, que em sua qualidade de proprietário, assegurando aos trabalhadores com os quais ele contratou: meios de subssistência semelhantes aos que eles teriam encontrado em seu país; que suas condutas, não mais que as de Villotte, que lhe emprestou seu concurso para preparar os "baux à Cologne", não se incluiriam então nas previsões da lei de 18 de Julho de 1860;
                Por estes motivos o Tribunal confirma o julgamento do Tribunal Correcional de Périgueux, datado de 20 de Setembro último, que pronunciou a absolvição dos dois acusados, sem despesas;

                                                            Seguem assinaturas                          
      



9- Esse é um documento importante e mais agradável de ler, pois é uma apresentação resumida de tudo o que concernia até então ao que chamamos "CASO ALIBERT" sob um novo prisma. É primeiro documento/relatório relacionado ao fato emitido  no BRASIL, mais específicamente pelo cônsul francês, no RIO DE JANEIRO, em 20 de Outubro de 1887. Trata do tema, como podemos ver em nota no meio e à esquerda da primeira página, do abandono da dita "COLÔNIA PERIGORDINA" na FAZENDA MONTE CRISTO" por alguns dos imigrantes e suas famílias.            


                                                                                                                                     



                                                            Senhor Ministro

               

                                         Eu tenho a honra de informar Sua Excelência que no mês de Março do último ano, o senhor Alibert, Firmin François, originário de Terrasson, Dordonha, foi à França contratar, para ele e um brasileiro, o Comendador de Moraes, colonos franceses que ele levou ao Brasil, os destinando à cultura do café, sendo o número de escravos dos quais um e outro são proprietários insuficientes para fazer produzir os imensos terrenos incultos que eles possuem na província de Minas Gerais.
       Alibert pensou que lhe seria mais fácil ter sucesso em seu empreendimento fazendo propaganda no departamento da Dordonha, onde ele teria certamente mais influência para convencer as pessoas a segui-lo.
      Ele encontra, entretanto, muita resistência por parte das famílias de nossos cultivadores, dos quais a vida e a existência eram modestas e tranquilas e que não desejariam de forma alguma comprometer o pouco que eles possuíam; mas Alibert lhes fez tão grandes promessas lhes assegurando que (...) uma situação bem  superior aquela que eles tinham na França, lhes permitiria conquistar em pouco tempo uma pequena fortuna.
        Para ajudar-lhe em seu empreendimento, Alibert teve o concurso ativo do senhor Villotte, antigo notário, que foi encarregado de explicar as cláusulas dos contratos, de ressaltar todas as vantagens e do qual os conselhos muito contribuiu à que os colonos se decidissem a  vir ao Brasil.
        Todas essas diligências atraíram a atenção do senhor Ministro do Interior e, no momento onde os colonos,  já em Bordeaux, estavam prontos a embarcar, processou oficialmente Alibert, impediu sua partida para que ele responda ao processo intentado contra ele diante do Tribunal Correcional de Périgueux, julgando ... com razão que os contratos passados não dão nenhuma garantia aos interessados.
          O Tribunal de Périgueux, em 23 de Setembro de 1885, pronunciou um julgamento, em favor de Alibert e Villotte; apelação dessa sentença foi feita à corte de Bordeaux que por uma sentença datada de 11 de Fevereiro de 1886 a confirmou, aprovando assim um contrato do qual a execução deveria ter lugar no Brasil, onde ele não poderia produzir nenhum efeito.
          A autoridade francesa tinha compreendido perfeitamente que Alibert tinha vindo recrutar emigrantes e que seu empreendimento não era mais que uma especulação bem estudada, onde o interesse dos colonos é inteiramente sacrificado, como os eventos vêm provar. De fato, não podendo aumentar o número de seus escravos sem despender um capital importante, ele pensou em fazer emigrar colonos europeus; que ele teria assim, à sua disposição, um maior número de trabalhadores, dos quais as despesas seriam menores, já que adiantando-lhes as despesas de viagem, ele se asseguraria do reembolso por um artigo do contrato.
          A partida dos colonos para o Brasil efetuou-se em 5 de setembro de 1885; Alibert, obrigado a permanecer na França para responder ao processo do qual ele era objeto, avisou, por despacho telegráfico ao senhor Laurier, seu sobrinho, que tomasse as medidas necessárias para receber os colonos em sua chegada. O vapor Orenoque, no qual eles estavam embarcados, entra no Rio em 24 no mesmo mês. Mal ele lançou âncora, o senhor Laurier se apresenta à bordo, acompanhado de um agente da Inspetoria de Terras e da Colonização, à fim de conduzi-los à hospedaria dos imigrantes, onde eles foram recebidos às custas do governo brasileiro. Ele não lhes permitiu desembarcar livremente e força-lhes a obedecer às ordens de Laurier; tendo pedido para ver seu Cânsul para lhe falar de seu caso, o agente de Alibert recusou dizendo que era inútil. Nossos colonos foram transportados, sempre às custas do governo brasileiro, até a estação de trem mais próxima da fazenda de Alibert-Moraes, distante de muitas léguas, o que exigiu, para chegar, uma caminhada forçada de perto de duas horas.
           Essa colônia, estabelecida únicamente para as famílias francesas, é longe da residência principesca de Alibert da qual fala o advogado Schaeffer, encarregado da defesa dessa causa diante do Tribunal de Bordeaux: ela está situada em um local isolado.
          Tarde demais, nossos colonos reconheceram que eles tinham sido indignamente enganados, e que seu contrato era ilusório, como o afirmou o ministério público; ele havia sido feito para favorecer a saída da França e fazer crer em benefícios que assegurariam seu futuro.
          Eu tenho a honra de remeter em anexo à Sua Excelência Senhor Ministro, cópia certificada desses documentos, um exemplar do pleito Schaeffer, bem como uma brochura "Guia do Imigrante no Brasil", à fimd e que ele possa bem julgar a natureza desse contrato, no qual Alibert não assume nenhuma responsabilidade e não suporta em definitivo nenhum encargo; ele faz aos colonos o adiantamento das despesas de viagem na condição de que elas sejam reembolsadas, no prazo de dois anos; ele as declara como despesas à seu cargo e consequentemente como uma vantagem que ele dava aos colonos, a isenção dos direitos da alfândega que é na verdade um favor feito ao governo brasileiro diretamente ao imigrante, assim como  a alimentação e a passagem gratuita na estrada de ferro até a estação mais próxima do lugar de destino.
          Ele teve a boa fé de explicar esta cláusula para que o imigrante saiba bem que ele não poderia reclamar nada a esse respeito.
          A alimentação que ele se compromete a dar durante um ano, se comporá, diz ele, exclusivamente de toucinho, arroz, feijão preto, milho, café com rapadura (resíduo da cana): o tratamento é inferior ao do escravo, que recebe carne seca e farinha de mandioca, alimentos mais substanciais.
          Assim nossos colonos, habituados a viver na França em melhores condições, jamais puderam se habituar a essa alimentação que não comportava nem pão, nem carne, nem bebidas de nenhuma espécie e eles fizeram grandes sacrifícios para que seus filhos não sofressem demais.
          No que concerne ao lote de cafezal em plena produção que devia ser dado a cada imigrante para cultivar, Alibert teve o cuidado de não declarar o número de pés de cada plantação, de maneira que ele distribuiu os lotes em partes tão pequenas que a metade dos produtos da colheita, única retribuição dos cultivadores, não representa o valor do salário de um doméstico, porque não era possível ao colono fazer uma outra cultura e ter animais, como o autorizava seu contrato, porque Alibert não os favoreceu em nada para melhorar sua situação.
          Em sua chegada à fazenda, nossos infelizes colonos, que na França tinham na casa a vida ínitma da família, pensam em encontrar ao menos, na propriedade de Alibert, o equivalente do que eles tinham deixado em seu país; mas seu espanto foi ao cúmulo quando Laurier lhes mostra, para sua residência, uma vesta construção feita para alojar negros, dividida em tres compartimentos e onde eles foram obrigados a se instalar, mal mal, muitas famílias juntas; pode-se imaginar como essas pessoas sofreram nessa vida comum. Alibert pode partir da França em 20 de Setembro; logo após sua chegada, ele se dirigiu para a província de Minas. Os colonos já começam a se queixar; eles não estavam satisfeitos nessa vida comum, e não era o que tinha sido combinado.
          O processo Alibert/Villotte seguia seu curso, na França; ele estava em apelação diante da corte de Bordeaux e Alibert tinha apressado sua partida para vir ao Brasil procurar provas à favor de seu empreendimento. Ele se dirige aos colonos, renova-lhes suas promessas, dizia-lhes que ele não era responsável pelo que havia sido feito em sua ausência; que contava com os sentimentos benévolos à seu respeito e fez com que eles assinassem uma declaração já redigida, no Rio, por um advogado conhecido dessa cidade, para as necessidades de sua causa a fim de enviá-la a seu advogado em Bordeaux, que acrescentou esse documento ao dossiê, no interesse da defesa. É a mesma  origem da qual todas as informações sobre a colonização foram tomadas.
          O advogado Schaeffer quis citar uma opinião do Dr.Couty, que teria dito: “o operário adulto, trabalhando como ele trabalha na Europa, colocará facilmente de lado mil francos no final de um ano, tanto a produção é abundante nesse país”.  Mestre Schaeffer faz uma falsa interpretação do pensamento de Couty: trata-se de colonização, onde o proprietário do solo estabelecia o colono e sua família, com o direito de adquirir as terras que ele cultivasse em certas condições que, uma vez preenchidas, o consituem proprietário de pleno direito e gozo, assegurando também seu futuro e o de sua família; essa é a verdadeira colonização, que oferece vantagens reais e que pode ser permitida pelos governos.
          Alibert não supunha que com o tratamento que ele dava aos imigrantes eles fossem capazes de tomar uma resolução enérgica, refletindo sobre sua situação, não tendo nenhum esperança de alcançar benefícios;  os recursos que eles tinham trazido com eles da França se esgotando, eles estariam, em pouco tempo, impedidos até mesmo de vir ao Rio. O que determinou dez famílias entre as dezenove imigradas, a abandonar a colônia e a se dirigir ao Rio para tentar sair da situação deplorável na qual eles se encontravam; elas chegaram nessa cidade em 25 de Setembro e se dirigiram a esse consulado.
          Eu não saberia expor à Vossa Excelência, Senhor Ministro, a emoção que eu experminetei vendo essas dez famílias de cultivadores, honestos, trabalhadores, aos quais, não havia um ano, tinham prometido vantagens consideráveis, encontrando-se agora na necessidade. Eu avisei nosso Ministro, Senhor Conde Amelot de Chaillou, do que acabava de se passar e, visto a urgência, ele decidiu prover para todos os meios possíveis à sua existência. O desejo de todos era voltar para a França, lamentando a posição que lhes tinham feito perder... Alguns se encontrando ainda com algum dinheiro puderam obrter passagens a preços reduzidos e já devem estar de volta a seus departamentos; outros foram estabelecidos em diversar casas; outros, enfim, foram para a propriedade de um engenheiro brasileiro, Senhor Bahiana, que ofereceu àqueles que quizessem se estabelecer, lotes de terreno de uma certa "contenance", tornando-os proprietários mediante uma soma pouco importante a pagar, quando eles pudessem, seu princípio sendo de querer povoar suas propriedades com pessoas honestas e a ocasião não poderia ser melhor.
          Duas famílias foram particularmente provadas durante sua estadia na colônia perigordina, e eu tive que lhes conceder o favor do repatriamento, em virtude da autorização do senhor Ministro do Interior, em data de 18 de Fevereiro último; uma delas, a família Gaspard, teve que ficar 15 dias num hospital do Rio para se restabelecer, antes de estar em condições de voltar para a França; a família Teuilleras, Jean Camille estava nas mesmas condições. 
          Eu tenho a honra, Sr.Ministro, de remeter em anexo à Vossa Excelência, a lista das 19 famílias contratadas na França por Alibert. Desse total, nove continuam na colônia perigordina, mas a opinião geral é a de que elas serão forçadas a seguir o exemplo das outras. Eu tenho a honra, igualmente, de remeter em nexo à Vossa Excelência Senhor Ministro, a lista dos imigrantes que voltaram para a França,.
          Malgrado tudo o que eu pude fazer para expor à Vossa Excelência todas as circunstâncias desse caso, minhas informações são incompletas e pode acontecer que um inquérito seja julgado útil para estabelecer a responsabilidade que deve incumbir à Alibert que, com o objetivo de interesse pessoal, não hesitou em sacrificar a posição e o futuro de famílias que tiveram que suportar privações sem número e perdas consideráveis; e é de toda justiça que aqueles que tão indignamente lhes enganaram sejam obrigados a indenizar-lhes pelos prejuízos sofridos.
          Queira aceitar o respeito com o qual eu tenho a honra de ter,
                            Senhor Ministro de Vossa Excelência, o muito humilde e muito obediente servidor. 

                                                                                                __________________________
                                                                                                        assinatura ilegível                                                                                                                                                                                                                                                                        





                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                             

2 comentários:

  1. Maravilha Marly! Agora entendi como o Alibert foi inocentado, só não consegui descobrir ainda como os Mouty entraram nessa, espero ver outros capítulos. Impressionante a força que nossos antepassados imigrantes tiveram, foram enganados por falsas promessas, mas conseguiram dar a volta por cima e seguiram em frente. Valeu! Bjs... Lalá.

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    1. Lalá querida... Tenho cópia do processo Mouty, mas mesmo assim não fica mesmo muito claro como Pierre (ou Pierres...) foram introduzidos nesse emaranhado. Qual o exato papel que desempenharam. Se nem você em seu livro, nem Pascale no próximo dela (que já está no forno), publicarem sobre esses documentos... eu publicarei. Prometo. A não ser que vocês ou ela prefiram o contrário. Combinado? Abração bem forte!

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