FONTE: FACEBOOK DO PRÓPRIO |
No dia 09 de Outubro de 2019, CHICRE FARHAT, o polêmico, o sincero, o vulcão, o poço de sentimentos e de palavras diretas e verdadeiras, nos deixou. Passados alguns dias, desejo que tenha conseguido toda compreensão de coisas e pessoas que sempre buscou e que, nesse momento, tenha apreendido a ideia/realidade de Deus, aquela que nos dá consolo nessa terra. Que, na presença d'Ele, tenha encontrado todas as respostas e toda paz que possa haver.
Embora tendo notícias de sua existência desde minha infância passada em BICAS, foi só na idade adulta, quando despertei para a pesquisa histórica de minha família, que passei a buscar a compreensão e o conhecimento de seus escritos, de sua pessoa, de suas palavras. E foi aí que também tomei conhecimento de seu irmão EMIL e de seu primo FUED, que me forneceram material de grande valor, embora a níveis diferentes, para os primeiros "goles" da tão rasa, superficial e incompleta história de nosso pequeno pedaço de chão. Sem a contribuição dessa família, me pergunto quão ainda mais rasa e árida seria a compreensão da intimidade sócio-histórica de BICAS.
Mesmo tendo vivido na mesma cidade que CHICRE, sempre me pareceu maior a distância entre MADUREIRA e IPANEMA que entre MADUREIRA e BICAS. Cariocas entenderão. Devido a isso, nunca o conheci pessoalmente. É de minha convivência com o mundo e as pessoas que foram o centro nevrálgico de seu coração exaltado e cansado que nasceu me interesse em sua pessoa, em sua história, em suas contradições, em seus sentimentos e palavras sempre tão contundentes. Chego a crer que eu, pessoalmente, nunca conheci alguém tão sincero em minha vida. Se um dia a luz de verdade, daquelas que clareiam e não daquelas que, na verdade, buscam perturbar a visão, se voltar para sua obra, suas queixas e questionamentos, talvez BICAS comece a caminhar para o futuro e se "desamarre" de tanta história social sem base na realidade histórica. Também sou avessa a mumunhas e enaltecimentos de falsas verdades.
Seja lá o que for que o senhor tenha podido encontrar "do lado de lá", certamente foi mais feliz do que nessa terra, nos últimos anos. Isso me consola e, tenho certeza, a todos aqueles que o queriam bem e admiravam. Obrigada por cada gota de atenção que me dispensou em nossos embates filosófico-religiosos e em nossas divagações históricas. Obrigada também por suas obras, indispensáveis. A maior delas? Para mim, "O RESGATE". Diga para seu irmão EMIL que o "DINHEIRO NA ESTRADA" dele é quase meu livro de cabeceira. E não deem por aí muito trabalho à dona ÁSSIMA, depois de matarem as saudades...
FONTE: FACEBOOK DE WALESKA PENCHEL |
Respeitosamente,
Marly Mayrink
Para vocês, leitores, uma pequena coletânea de imagens de CHICRE FARHAT e de sua obra.
A CASA ESTÁ ALI
"Na praça, minha casa está ali.
Fechada ou aberta, sempre
na resistência.
Enfrentou meio
século de cocho e cabresto.
Abro a porta, ando pelos
corredores, quartos.
Sombra, vultos, ouço passos,
a memória se acende.
Profetizava Mario Quintana:
- "Não importa que a tenham
demolido. A gente nunca esquece
a velha casa onde nasceu."
Meu pai morto, na sala de visitas.
Setembro de 1940.
Desesperada, aos prantos e
lamentos, minha mãe sofre.
Nove filhos torturados na dor.
Ao sair o enterro, sete irmãs
nas janelas gritam e choram.
A Banda de Música dos ferroviários
toca a Marcha Fúnebre de Chopin.
Minha casa está ali, tão grande,
de esquina, como flor de luto,
intocável.
Quintal, jardim, horta, árvores
frutíferas, enorme pé de abacate e
galinheiro. Mundo lúdico.
No porão, a lenha cortada por Isidoro,
que também esvaziava engradados
de cachaça, decantando para o
Bar Memphis.
Pastel do Tião, nosso empregado e
amigo há trinta anos.
( Minha casa está na Praça do
democrata Raul Soares,8, com o busto
do ex-ditador fascista Getúlio Vargas )
Bofetada na grandeza do nobre gesto
da DOAÇÃO.
Tanto desprendimento, o! Deus.
Por que? Para quem?
Para minúsculas amebas,
sem presente, passado,
tradição, sem história,
e biografia de apagada evil tristeza."
Abro a porta, ando pelos
corredores, quartos.
Sombra, vultos, ouço passos,
a memória se acende.
Profetizava Mario Quintana:
- "Não importa que a tenham
demolido. A gente nunca esquece
a velha casa onde nasceu."
Meu pai morto, na sala de visitas.
Setembro de 1940.
Desesperada, aos prantos e
lamentos, minha mãe sofre.
Nove filhos torturados na dor.
Ao sair o enterro, sete irmãs
nas janelas gritam e choram.
A Banda de Música dos ferroviários
toca a Marcha Fúnebre de Chopin.
Minha casa está ali, tão grande,
de esquina, como flor de luto,
intocável.
Quintal, jardim, horta, árvores
frutíferas, enorme pé de abacate e
galinheiro. Mundo lúdico.
No porão, a lenha cortada por Isidoro,
que também esvaziava engradados
de cachaça, decantando para o
Bar Memphis.
Pastel do Tião, nosso empregado e
amigo há trinta anos.
( Minha casa está na Praça do
democrata Raul Soares,8, com o busto
do ex-ditador fascista Getúlio Vargas )
Bofetada na grandeza do nobre gesto
da DOAÇÃO.
Tanto desprendimento, o! Deus.
Por que? Para quem?
Para minúsculas amebas,
sem presente, passado,
tradição, sem história,
e biografia de apagada evil tristeza."
DESABAMENTO DA ESCOLA
"AV. GOVERNADOR VALADARES,foi a homenagem pendurada na na raquítica biografia do "GOVERNADOR"SEM VOTO, ZERO À ESQUERDA.Reles "INTERVENTOR" do ESTADO NOVOfascista, do Getúlio. Traiu Minas de Tiradentes e o Brasil de Ruy Barbosa.O Grupo Escolar Cel. Souza, da rua D.Anna,o único da cidade desabou, em surdo estrondo, em noite de chuva. Caiu de podre. E se de dia acontecesse a tragédia, alunos eprofessores presentes?OITO ANOS, BENEDITO VALADARES largouao chão o monturo lambão do desgoverno.OITO ANOS, o lixo escolar apodreceu na terra.Em porões úmidos e fétidos de velhas casas,nos salões de catação de café, prosseguiramas aulas.Alunos sentados no chão, sem carteira, quadronegro, banheiro.Desastrado INTERVENTOR da ditadura Vargas,comovida, minha geração agradece esses anos de chumbo e ultraje.Na AV. GOVERNADOR VALADARES, quandopor lá passamos, fazemos o sinal da cruz.Sem erro, na Reta está seu nome..."
DIREITAS PALAVRAS
"Vim para o canto do cisne, numa finita plumagem, como pobre folha amarela de outono. Olho o verde amanhecer das montanhas, campos orvalhados, a beleza da fonte suave cantando, sinto o refinado ar da infância, o imenso arco azul leve do céu, onde sonhos foram sonhados, bruma dos esquecimentos, a alvorada de neblina. Tudo me fala e entendo: escuto rosas e girassóis desses canteiros de lírios. Inclino-me ante criaturas, que me acolheram, resgato dívidas, e deposito o mesmo número de lágrimas da gratidão.Há abrir de baú, onde guardo afetos.Ainda ouço o rouco apito da Oficina, de 117 anos. Abraço o irmão ferroviário, largado só na estrada, em férrea manobra.Arrancaram trilhos, que tantos sonhos conduziram. Generosos, nos deixaram o carvão, a fuligem e a graxa.Falta-me a mesma força, ando lento, o coração amparado na muleta do "marca passo." Por mais de meio século, na tribuna, jornais, livros abri horizontes.Se me permitem a confidência:DOAMOS, eu e irmãos, valioso tesouro de fundas lembranças, que ainda doem, por não esquecê-las. Ainda ouço vozes.Nenhuma esperta nomeação, qualquer verba ou troca, projeto algum reivindiquei para mim. Nada possuo, sequer efêmero pedaço de chão, onde cair morto.Assessor Especial do prof.Bilac Pinto, Secretário de Finanças do Gov. Magalhães, trouxe à BICAS, o GRUPO ESCOLAR RETTO JR., a CAIXA ECONÔMICA ESTADUAL e a BIBLIOTECA PÚBLICA, fora o material escolar e a montagem de cantinas para vários Grupos. Nesta angústia do tempo, tem a consciência a mesma leveza dos belos pássaros coloridos de minha terra.Ah! perguntas sem palavras.Alguma mágoa esquecida, ou remota culpa inocente, busco perdão.Poupou-me Deus o sentimento do rancor e da ingratidão."
Descerrando uma placa em sua homenagem. FONTE: Facebook de CHICRE FARHAT |
Folder exibido no COLÉGIO ELITE, quando CHICRE FARHAT recebeu a alegria e a honra de ser nomeado patrona da biblioteca daquela escola. |
NOVENTA ANOS
"HOJE, DIA 12 DE FEVEREIRO,TOMEI DERRADEIROS REMÉDIOS DA INCERTA
SOBREVIVÊNCIA. DIA 5 DE MARÇO, PRÓXIMO, CHEGA AOS NOVENTA ANOS DE IDADE.
DA VIDA, NÃO ESPERO MAIS NADA. ACABOU. FORAM-SE MEUS PAIS, IRMÃOS, PARENTES E AMIGOS, COLEGAS DE TODOS OS TEMPOS: DA INFÂNCIA, DO PRIMÁRIO, NO EXTERNATO STA. TEREZINHA, DO SECUNDÁRIO E CLÁSSICO, NO INSTITUTO GRANBERY, INTERNO, SETE ANOS, EM JUIZ DE FORA, E NO RIO, EM 1947, NA UFRJ, ONDE CURSEI DIREITO, E O CONCLUI, EM 1951,COMO ORADOR DA TURMA.
EM GRANDE PARTE DESSE TEMPO, PARTICIPEI NOS JORNAIS, LIVROS, NA TRIBUNA, COMO CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL, NUMA DOUTRINAÇÃO CONSTANTE (SOB AMEAÇA E TENTATIVA DE SUBORNO), VISANDO À FORMAÇÃO DE LIDERANÇA NA CIDADE, AFINAL, RESULTANDO NA ELEIÇÃO DE DOIS NOVOS PREFEITOS, DISTANTES DOS VELHOS TEMPOS DA MIÚDA POLÍTICA DO COCHO E CABRESTO.
APAGA-SE A ESPERANÇA, FIMBRIO HORIZONTE DISTANCIA-SE. SOFRIDAS AUSÊNCIAS FICAM. A SAUDADE DO MOMENTO DE PERMANENTE REBELDIA. SINTO, MEU TEMPO MADURO SE DESLIZA, IRREFREÁVEL, PARA O FIM.
CURVAS DA EXISTÊNCIA, MAIS DO QUE A NOITE, OBSCURECEM O QUE FICOU PARA TRÁS. VIVEMOS O FASTÍGIO DAS CORES E FORMAS HUMANAS. GERAÇÕES NOVAS SOFREM DESSA CONVERSÃO DE VALORES.
DESEJA A MORTE SE APROXIMAR DE NÓS A TODO INSTANTE.
ELA MESMA É COISA DE INSTANTE. (TALVEZ TENHA QUE ANDAR MAIS UM BOCADO ANTES DE ENCONTRÁ-LA).
MURCHA MINHA GERAÇÃO. HÁ UMA INVERSÃO DRAMÁTICA,
UM MOMENTO DE CULPAS, APREENSÕES, INCERTEZAS.
ENCONTRO AS PALAVRAS DO MEU QUERIDO IRMÃO, EMIL,
NO LIVRO DE MEMÓRIAS:"HISTÓRIAS OUVIDAS E VIVIDAS."
- " É CERTO, NÃO VIVI A VIDA QUE ESPERAVA. MAS VIVI COISAS INESPERADAS, SURPREENDENTES FELIZES E BOAS.
CHEGO A ESTE PONTO COMO GRANDE DEVEDOR. ALGUNS AMIGOS FICARAM ME DEVENDO POUCAS COISAS. EU ESTOU DEVENDO A TODOS. POR TEREM SIDO AMIGOS."
DA VIDA, NÃO ESPERO MAIS NADA. ACABOU. FORAM-SE MEUS PAIS, IRMÃOS, PARENTES E AMIGOS, COLEGAS DE TODOS OS TEMPOS: DA INFÂNCIA, DO PRIMÁRIO, NO EXTERNATO STA. TEREZINHA, DO SECUNDÁRIO E CLÁSSICO, NO INSTITUTO GRANBERY, INTERNO, SETE ANOS, EM JUIZ DE FORA, E NO RIO, EM 1947, NA UFRJ, ONDE CURSEI DIREITO, E O CONCLUI, EM 1951,COMO ORADOR DA TURMA.
EM GRANDE PARTE DESSE TEMPO, PARTICIPEI NOS JORNAIS, LIVROS, NA TRIBUNA, COMO CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL, NUMA DOUTRINAÇÃO CONSTANTE (SOB AMEAÇA E TENTATIVA DE SUBORNO), VISANDO À FORMAÇÃO DE LIDERANÇA NA CIDADE, AFINAL, RESULTANDO NA ELEIÇÃO DE DOIS NOVOS PREFEITOS, DISTANTES DOS VELHOS TEMPOS DA MIÚDA POLÍTICA DO COCHO E CABRESTO.
APAGA-SE A ESPERANÇA, FIMBRIO HORIZONTE DISTANCIA-SE. SOFRIDAS AUSÊNCIAS FICAM. A SAUDADE DO MOMENTO DE PERMANENTE REBELDIA. SINTO, MEU TEMPO MADURO SE DESLIZA, IRREFREÁVEL, PARA O FIM.
CURVAS DA EXISTÊNCIA, MAIS DO QUE A NOITE, OBSCURECEM O QUE FICOU PARA TRÁS. VIVEMOS O FASTÍGIO DAS CORES E FORMAS HUMANAS. GERAÇÕES NOVAS SOFREM DESSA CONVERSÃO DE VALORES.
DESEJA A MORTE SE APROXIMAR DE NÓS A TODO INSTANTE.
ELA MESMA É COISA DE INSTANTE. (TALVEZ TENHA QUE ANDAR MAIS UM BOCADO ANTES DE ENCONTRÁ-LA).
MURCHA MINHA GERAÇÃO. HÁ UMA INVERSÃO DRAMÁTICA,
UM MOMENTO DE CULPAS, APREENSÕES, INCERTEZAS.
ENCONTRO AS PALAVRAS DO MEU QUERIDO IRMÃO, EMIL,
NO LIVRO DE MEMÓRIAS:"HISTÓRIAS OUVIDAS E VIVIDAS."
- " É CERTO, NÃO VIVI A VIDA QUE ESPERAVA. MAS VIVI COISAS INESPERADAS, SURPREENDENTES FELIZES E BOAS.
CHEGO A ESTE PONTO COMO GRANDE DEVEDOR. ALGUNS AMIGOS FICARAM ME DEVENDO POUCAS COISAS. EU ESTOU DEVENDO A TODOS. POR TEREM SIDO AMIGOS."
"É, minha mãe (4 de
dezembro),mais um ano de escuridão e silêncio.Lá do fundo do Maripá de Minas (ondeo alcançou à cavalo, em sofridas horas,vindo de Bicas, após desembarque de trem).Vilarejo sem médico, sem remédio, luzelétrica, escola, sem recursos, você resistiu.Com quinze
anos, longe dos parentes,
amigos, do Extremo Oriente, tudo arrancado
do frágil coração, na aventura à América...
Afetuosa mulher árabe, dela jamais se ouviu
a pálida faísca do lamento.
Daquele
fim de mundo do início do século,
filhos chegavam.
NOVE herdeiros assustavam, mas distribuiu
a última gota de mel.
Em 1940, já em Bicas, o jovem companheiro
de sonhos se foi, sem um gemido.
Alcançava
a dor horizonte sombrio,
tamanho desafio, instigante.
Sozinha, viúva, em pequena cidade, com
sua pobreza de dádivas,
não nos deixou dispersar.
Prendeu-nos com grilhões da bondade humana.
Ah! querida, tão longe, como gostaria voltar ao
que era".
FONTE: Facebook de CHICRE FARHAT. |
Concluo com as imagens abaixo, da grande e mal correspondida paixão do Sr. CHICRE FARHAT, reiterando que as plameiras que hoje cobrem o nome de sua tão querida ÁSSIMA continuem crescendo e crescendo até que ele fique para sempre visível e à descoberto. Como era de seu desejo. Com carinho concluo. Ao senhor, minhas sinceras homenagens.
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ResponderExcluirMeus sinceros agradecimentos pela homenagem e palavras de carinho e respeito ao meu saudoso pai.
ResponderExcluirHoje por acaso pensando nele leio essa linda homenagem retirada de seu Facebook doce lembrança , q sempre pensei em como poderia resgatar seus escritos , , meu pai foi bem maior q Bicas mas Bicas sempre foi maior no seu coração obrigada amiga Cláudia de Farhat
ResponderExcluirSensibilizado ofereço minha gratidão e amizade Marly Marink
ResponderExcluirDigo Marly Mayrink
ResponderExcluirPrezada Cláudia... Não cheguei a conhecer pessoalmente seu pai, mas minha família sim. Ele foi sempre muito gentil e carinhoso comigo e, conhecedora de sua obra, só tenho a agradecer que essa postagem tenha te trazido tantos bons sentimentos. Ele merece. Obrigada e volte sempre!
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