Bom dia, amigos leitores!
Como vocês bem sabem, sempre fui leitora inveterada do Jornal 'O MUNICÍPIO", de Bicas. Há algum tempo, ele deixou de ser publicado no formato original, em papel. E chegou ao mundo virtual. Desde essa ocasião, confesso que não o havia visitado. Mas como sempre é tempo de corrigir nossas falhas, eis que, durante a semana que passou, cliquei sobre um link publicado por JOSÉ ARNALDO, um dos colunistas, no grupo do Facebook chamado 'MINEIROS DE BICAS". Conclusão: nunca mais o largarei. Subitamente me dei conta do quanto andava com saudade de tudo, principalmente das publicações de JOSÉ LUÍS MACHADO RODRIGUES, o LUJA, que tanto enriquece aqueles que se interessam por aprofundar-se na história genealógica de nossa região. Dentre tantas pérolas, encontrei essa. LUJA tem um veio de poeta ou de "um não sei que" que encanta na maneira como descreve fatos já até conhecidos, mas não tão "pressentidos" como nos é possível através de sua fala. Nesse texto estamos, é claro num tempo anterior a "grande vinda" de imigrantes estrangeiros não lusos, como por exemplos nossos DOUSSEAU. Estamos nos primórdios do povoamento de nosso pequeno naco de ZONA DA MATA, sendo desbravado pelos desencantados do ouro. Leiam. Saboreiem. E vejam se não tenho razão.
" Da minha aldeia
vejo quanto da terra se pode ver no Universo… Por isso a minha aldeia é tão
grande como outra terra qualquer" Fernando Pessoa
Do desembarque no porto do
Rio de Janeiro até suas terras no leste mineiro eram léguas de caminhada em
lombo de burro ou, à pé. E a Aldeia de destino não ficava no meio do oceano,
como convinha a naturais de um arquipélago. Não tinha mar de biquínis
“vestindo?” mulheres bonitas. Não tinha sungas em corpos sarados, nem barracas
de praia e barracos na grimpa dos morros para atrair turistas. Ela era apenas
um “meio do mato”. Era parte da Zona da Mata. Mas esta Aldeia atraiu
descendentes de imigrantes provenientes das Ilhas dos Açores. É bem verdade que
perto dela, à moda dos poetas até “inventaram” um Mar de Espanha que, de
verdade, também faz parte desta história por ter sido sede da vila que
administrava as coisas da Aldeia. Mas este “galho” do assunto tem que ficar
para outro artigo, por uma questão de espaço. Da Aldeia da qual se fala é
correto dizer que era cercada por montes. E às sequências dos mais altos os
habitantes e os que por ali passavam resolveram denominá-las: Serra das Bicas e
Serra do Rochedo. Destas serras, de algum ponto imaginário e com binóculo possante,
talvez fosse possível avistar, para os lados de Belo Horizonte, um distante
horizonte de relevo e vegetação variada a se fechar nos altos contrafortes da
Serra da Mantiqueira. Nestes contrafortes se poderia imaginar ver, então, a
primeira sede da Aldeia. A vila mãe que administrava a porção maior e mais
antiga do domínio territorial desta região da Mata. A antiga Vila de Nossa
Senhora da Piedade da Borda do Campo, que segundo Waldemar de Almeida Barbosa
no seu Dicionário Histórico Geográfico de Minas Gerais, é a atual Barbacena, “a
primeira povoação das Minas, vindo do Rio de Janeiro”. Nas encostas da serra
chamada Bicas, nas proximidades do que se tornou a Aldeia à qual esta história
quer chegar, nascia água limpinha, que se bebia em folha de inhame ou, na
concha da mão. Não era água tratada pela COPASA, mas limpa o suficiente para
tratar da sede e fadiga causada pela lida constante e pelas aventureiras
viagens. E cultivaram-se grandes roças. Uma delas, inclusive, adotou o nome de
Roça Grande. Ali, a poder da enxada e de rústicas técnicas tirava-se da terra o
milho e outros alimentos como arroz, feijão, cana, abóbora, inhame e o mais
possível para abastecer os tropeiros que vinham e voltavam às Minas Gerais. E
por ali viveram alguns descendentes de açorianos como os FERREIRA DA FONSECA,
dos quais nesta série de artigos O Município se ocupa. Uma gente muito bem
definida por Oswaldo Rezende, em Genealogia dos Resendes, São Paulo (SP), 1974,
Editora Revista dos Tribunais, página 31, quando afirma “não ser segredo para
ninguém que os açorianos que se estabeleceram na província das Minas Gerais
eram simples e humildes, e vieram com o propósito muito natural de novas
condições de vida, embalados pela tradição de que aqui enriqueceriam
facilmente.” Nada muito diferente dos Ferreira da Fonseca que desbravaram
terras de Maripá de Minas, Guarará e Bicas. Homens fortes que cultivaram estas
terras num tempo em que, nas noites escuras, o céu da Aldeia oferecia apenas
estrelas e astros para orientar as viagens. Um tempo no qual não existia o
ronco e as luzes dos aviões de carreira que encurtam saudades e as longas
distâncias. Nem os satélites fabricados para refletirem imagens e sons em tempo
real. E nem gente deitada na relva ou na esteira tecida com a folha de Taboa, a
viajar em visões dos dias atuais: – este avião que se imagina seguir na direção
do Norte ou Nordeste, deve estar levando as alegrias dos que seguem em viagem à
Europa. Aquele outro, em sentido inverso, talvez traga as alegrias de quem
volta para casa. Ou será o oposto o verdadeiro sentido das alegrias e dos
viajantes ? Nestas noites, contar as estrelas no céu da Aldeia não era tarefa
difícil. Mas também não era o programa dos aldeões, porque poucos se davam
conta da importância do contar, fazer as quatro contas, ler e escrever. Muitos,
porque se ocupavam com tarefas que dispensavam este aprender. Outros, porque se
ocupavam com tantos afazeres que não lhes sobravam tempo para contá-las. Mas é
certo que os que ali chegaram para morar, o fizeram depois que o ouro de
aluvião, abundante na areia dos rios do centro da Província, começou a
escassear. A busca do mineral nos veios do subsolo, com as ferramentas e a mão
de obra disponíveis, tornou-se quase impossível. Então, parte dos que viviam da
atividade tomou o rumo da Mata. Embrenhou pela mata proibida para buscar a nova
riqueza, o café. E aqui, aprendeu a tomar leite in natura, saído de teta da
vaca para a caneca com açúcar batido (mascavo, para agradar ao corretor de
texto). A comer feijão tropeiro, couve, taioba, angu, broa de milho e rapadura,
como se verá noutra ocasião porque, por hoje, o ponto final desta história
precisa ser aqui."
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